Atravessando o túnel de Rebouças, Ipanema e o azul do mar da zona sul do Rio de Janeiro ficam para trás para adentrar na cidade cinza, muitas vezes escura. Uma terra incógnita que na zona norte é formada por um complexo de favelas, dificultando se lembrar do nome de todas.
Um complexo de favelas, como a do Alemão, ou de Israel ou da Penha: esta última na colina que abriga o sugestivo santuário de Nossa Senhora da Penha de França, guiado pelo padre Thiago Sardinha. Um bastião de espiritualidade e beleza, que emana paz e aproxima os mais humildes.
Centenas chegam ao local em memória do papa Jorge Bergoglio, assim como para homenagear o padroeiro do estado do Rio de Janeiro, São Jorge, o cavaleiro de luz que venceu o dragão e libertou o povo da escravidão. Uma figura sobre a qual as religiões de matriz africana, como o Candomblé e a Umbanda, muito difundidas no Brasil, projetaram seu orixá Ogum.
Subir os 382 degraus da escada até a igreja pode ser muito pesado para alguns fiéis – como idosos e crianças –, ainda que penitentes subam de joelhos em busca de uma graça. Ao mesmo tempo, o veículo que leva turistas é muito pequeno. Por esta razão, a missa principal foi organizada em uma estrutura mais ível. O dia também seria animado por um show da escola de samba Portela, que mais tarde foi cancelado em sinal de respeito à morte do Papa.

Mas não faltaram hinos durante o culto religioso, acompanhados pela voz do cantor portelense Led Motta, que recebeu aplausos.
"O Papa Francisco foi um líder religioso não só por ser sucessor do apóstolo Pedro, mas também por ser coerente com o que pregava", disse o padre Sardinha em sua homília sobre o pontífice, que esteve no Rio de Janeiro em julho de 2013 para uma histórica Jornada da Juventude, ao também celebrar uma missa na favela de Manguinhos, no bairro de Bom Sucesso. Foi ali que o Santo Padre (na Argentina, já ao lado dos “cura villeros”, os padres das favelas) quis ir ao encontro dos moradores e celebrar uma missa, organizada em um campo de futebol.
“O Papa foi um verdadeiro líder para toda a humanidade. Ele encheu o coração não só da maioria dos católicos, mas do mundo todo, porque era humilde e sabia ouvir a todos”, disse o padre.
Nas periferias do Rio de Janeiro, onde os movimentos evangélicos crescem aos poucos, sobressaindo-se sobre a essência das igrejas católicas, e o mantra é 'vai dar tudo certo', religião é coisa séria: é a esperança para chegar ao fim do mês, é um momento de solidariedade, uma força para acreditar que dias melhores virão, sem tiros, barricadas e balas perdidas. Um sentimento que Bergoglio soube interpretar.
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